A homilia do 6º Domingo da Quaresma de 13 de abril de 2025, foi escrita por Dom Anselmo Chagas de Paiva, monge beneditino do Mosteiro de São Bento, do Rio de Janeiro.
Caros irmãos e irmãs,
Com o domingo de Ramos iniciamos a Semana Santa e somos chamados a reviver os últimos momentos de Cristo em sua peregrinação terrena. A celebração consta de dois momentos: Inicialmente temos o relato da sua gloriosa entrada na cidade de Jerusalém e, em um segundo momento, a leitura da sua gloriosa paixão.
Logo no início da celebração temos a descrição da entrada de Jesus em Jerusalém montado em um jumentinho. Os mantos são estendidos diante dele e uma voz faz ressoar: “Bendito aquele que vem em nome do Senhor” (Lc 19,38). Em um clima de alegria os ramos são agitados em um sinal de festa, e também nós somos chamados a agitar os nossos ramos e somos convidados a seguir o Cristo. Caminhamos com ele. Jesus entra em Jerusalém mostrando a sua condição de rei e Senhor, mas com o objetivo de subir ao calvário e para morrer pregado em uma cruz: o seu trono glorioso, pois ele passa pela morte para chegar à ressurreição.
No relato da Paixão de Jesus temos a descrição do evangelista São Lucas, que nos apresenta o Cristo Senhor que vem ao nosso encontro, para manifestar a todos, em gestos concretos, a bondade e a misericórdia de Deus. Essa ideia está presente no gesto de curar o guarda ferido no Jardim do Getsêmani (cf. Lc 22,51) e no perdão conferido aos seus adversários. Isto quer mostrar que o discípulo de Jesus não pode agredir ninguém, mas deve estar sempre disposto a curar as feridas provocadas pelos outros e a perdoar mutuamente.
Em um outro momento da narração observa-se um detalhe. Pedro, após haver negado o Mestre, saiu para fora e começa a chorar. São Lucas narra que o “Senhor, voltando-se, fixou o seu olhar em Pedro” (Lc 22,62). Um gesto comovente que mostra a compreensão de Jesus pela fraqueza do seu discípulo e é também o sinal do perdão que lhe concede. Jesus é compreensivo e misericordioso e a todos lança o seu olhar misericordioso e repleto de amor.
No relato da Paixão, podemos ainda testemunhar os sofrimentos de Jesus, em particular a sua angústia na agonia no monte das Oliveiras. Contudo, mesmo diante deste sóbrio quadro, o Evangelista São Lucas relata com uma certa sutileza a misericórdia do Pai, ao transcrever em seu Evangelho algumas frases de Jesus. Nossos olhos se voltam para os momentos finais de Cristo na cruz, quando diz: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23,24). Jesus não se limita a perdoar, vai mais longe. Ele sabe que a fonte de todo o amor e de todo o perdão não está nele, mas no Pai. Ele se apresenta diante do Pai como o intercessor a quem o Pai nada pode recusar. Ele se apaga, para que vejamos que é a vontade do Pai que se está a cumprir. É a oração de Jesus por nós.
Jesus foi crucificado no meio de dois criminosos, considerados perigosos bandidos, em razão dos erros praticados. Um deles zombava do Cristo, enquanto o outro, após repreender o seu companheiro, disse a Jesus: “Lembra-te de mim, quando estiveres no teu reino” (Lc 23,42). E Jesus, mesmo agonizante, lhe respondeu: “Em verdade, vos digo, hoje estarás comigo no paraíso” (v. 43). O ladrão, que a tradição conhece como São Dimas, passou a ser conhecido como o Bom Ladrão e deixou para nós um exemplo de uma oração simples, onde pede apenas para ser lembrando, mas o Senhor lhe concede muito mais: estar na nova humanidade dos redimidos.
Todos os evangelhos sinóticos falam da requisição de Simão de Cirene para auxiliar Jesus levar a sua cruz (cf. Mt 27,32; Mc 15,21); no entanto, só o evangelista São Lucas sublinha que Simão transporta a cruz “atrás de Jesus” (cf. Lc 23,26). Este dado quer nos mostrar o modelo do discípulo de Cristo: é aquele que toma a cruz de Jesus e o segue no seu caminho, pois ele mesmo já havia dito: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz dia após dia e siga-me” (Lc 9,23). Possamos também nós acompanhar o Cristo neste momento. E com a atitude de Cireneu, que se coloca junto de Jesus, para auxiliá-lo a carregar a cruz, a dividir com ele este peso, possamos também lembrar de tantos que necessitam do nosso auxílio e da nossa ajuda, pois ele mesmo disse: “Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes” (Mt 25,40).
Logo no início da celebração litúrgica deste dia, a Igreja antecipa a sua resposta ao Evangelho, dizendo: "Sigamos o Senhor". É o seguimento. Somos chamados a considerar o caminho de Jesus Cristo como o caminho justo: uma peregrinação, um ir juntamente com Jesus Cristo. Um ir naquela direção que Ele nos indicou e nos indica. Jesus caminha diante de nós, e vai para o alto. Ele seguiu adiante. Ele sobe a Jerusalém. Ele também quer nos conduzir para Deus, mas, ao mesmo tempo, deseja habitar entre nós, estar totalmente conosco.
O seu caminho conduz para além do cume do monte do Templo até à altura do próprio Deus. É esta a grande subida à qual Ele nos convida a fazer. Assim, na amplitude da subida de Jesus tornam-se visíveis as dimensões do nosso seguimento a meta para a qual Ele nos quer conduzir: até às alturas de Deus, à comunhão com Deus. É esta a verdadeira meta. É a comunhão com Ele. É o caminho. A comunhão com Ele é um estar a caminho, uma subida permanente rumo à verdadeira altura da nossa chamada.
A cruz faz parte da subida para a altura de Jesus Cristo, da subida até à altura de Deus. Jesus sobe à altura de Deus através da cruz. A cruz é expressão daquilo que o amor significa: só quem se perde a si mesmo, se encontra.
E como a multidão que segue Jesus rumo ao calvário, possamos viver estes dias participando das celebrações em clima de oração e de unidade com Ele. E que ao longo desta santa semana, que nos leva à Páscoa, possamos trafegar por este caminho que nos faz lembrar a humilhação de Cristo. É o caminho da humildade. Percorrendo este caminho Jesus se fez servo. Ele esvaziou-se de si mesmo para ser o servo de todos.
Possamos pedir a intercessão da Virgem Maria para que tenhamos sempre o desejo de caminhar com Cristo. E junto com Maria, possamos contemplar ao pé da cruz Aquele que deu a sua vida por nós. E saibamos ser no mundo um sinal expressivo e eficaz do seu amor, expresso no sofrimento, visando a nossa salvação. Assim seja.
D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ